sexta-feira, 5 de junho de 2009

A arte de ser feliz

Houve um tempo em que minha janela se abria sobre uma cidade que
parecia ser feita de giz. Perto da janela havia um pequeno jardim
quase seco.

Era uma época de estiagem, de terra esfarelada, e o jardim parecia
morto. Mas todas as manhãs vinha um pobre com um balde, e, em
silêncio, ia atirando com a mão umas gotas de água sobre as plantas.
Não era uma rega: era uma espécie de aspersão ritual, para que o
jardim não morresse. E eu olhava para as plantas, para o homem, para
as gotas de água que caíam de seus dedos magros e meu coração ficava
completamente feliz.

Às vezes abro a janela e encontro o jasmineiro em flor. Outras vezes
encontro nuvens espessas. Avisto crianças que vão para a escola.
Pardais que pulam pelo muro. Gatos que abrem e fecham os olhos,
sonhando com pardais. Borboletas brancas, duas a duas, como
refletidas no espelho do ar. Marimbondos que sempre me parecem
personagens de Lope de Vega. Ás vezes um galo canta. Às vezes o avião
passa. Tudo está certo, no seu lugar, cumprindo o seu destino. E eu
me sinto completamente feliz.

Mas quando falo dessas pequenas felicidades certas, que estão diante
de cada janela, uns dizem que essas coisas não existem, outros que só
existem diante das minhas janelas, e outros finalmente, que é preciso
aprender a olhar, para poder vê-las assim.

Cecília Meirelles

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